“A face mais dura do aparelhamento do Estado brasileiro por forças políticas está sendo revelada nesse episódio da quebra do sigilo fiscal da filha do candidato do PSDB à Presidência da República. Em um país sério, o secretário da Receita já teria se demitido, envergonhado, ou estaria demitido pelo seu chefe, o ministro da Fazenda Guido Mantega. E alguém acabaria na cadeia.
Ao contrário, o secretário Otacílio Cartaxo tentou até onde pôde minimizar a situação, preferindo despolitizar o caso e desmoralizar sua repartição. Ao mesmo tempo surgem de vários lados do governo tentativas de contornar o problema, ora atribuindo à própria vítima a culpa da quebra de seu sigilo fiscal, ora sugerindo que uma disputa política dentro do próprio PSDB poderia ter gerado a quebra do sigilo fiscal de Verônica Serra. Uma análise muito encontradiça entre os políticos governistas é de que as denúncias, tendo aparecido em período eleitoral, perdem muito de sua credibilidade e de seu poder de influenciar o voto do eleitor, ficam com sabor “eleitoreiro”. Como se essa fosse a questão central. Pensamentos e atos de quem não tem espírito público.
O aparelhamento político da máquina pública não ocasiona apenas a ineficiência dos serviços, o que fica patente em casos como o dos Correios, outrora uma empresa exemplar e que se transformou em um cabide de empregos que gera mais escândalos de corrupção do que seria possível supor. Dessa vez a revelação de que a Receita Federal transformou-se em um balcão de negócios onde o sigilo fiscal dos cidadãos brasileiros está à venda, seja por motivos meramente pecuniários, seja por razões políticas, coloca em xeque uma instituição que, até bem pouco tempo, era respeitada por sua eficiência e pelo absoluto respeito aos direitos dos cidadãos.”
Merval Pereira
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